A farsa da tumba perdida de Jesus (Talpiot) e sua conexão ao código Da Vinci e ao Anticristo – Parte 1 (Introdução e recentes desenvolvimentos)
22-04-2015 11:37
NOTA IMPORTANTE
Este artigo será um pouco extenso e com muita informação técnica, mas mediante a importância do assunto (farsa para legitimar uma suposta descendência de Jesus da qual surgirá o Anticristo) vemo-nos obrigados a ser exaustivos na análise e nas fontes.
Por esta razão optaremos por fazer 4 partes, dessa forma tentaremos tornar o artigo menos cansativo para o leitor e de mais fácil consulta das fontes, proporcionando uma aquisição de conhecimentos mais facilitada e permitindo ainda ao leitor, tirar de forma consciente as suas próprias conclusões.
A História resumida
Em 2007 James Cameron (famoso realizador de Hollywood) envolveu-se (ou pagaram-lhe para se envolver) em assuntos religiosos e produziu um filme de 90 minutos para o Discovery Channel juntamente com o judeu ortodoxo Simcha Jacobovici intitulado: “O túmulo secreto de Jesus” (1). Nesse documentário indo contra toda a documentação histórica existente sobre a vida de Jesus, alegam que os ossos reais de Jesus de Nazaré foram enterrados num túmulo perto de Jerusalém.
Um livro complementar, “A tumba de Jesus”, escrito também por Simcha Jacobovici e Charles Pellegrino, também promove esta tese. Além disso, na tradição do desacreditado Dan Brown e do seu Código Da Vinci, o filme afirma que esses ossos de “Jesus” foram uma vez casados com Maria Madalena, com quem teve um filho com o nome de Judá. Posteriormente foi avançado pelo mesmo Simcha Jacobovici que afinal foram dois, os supostos filhos desta união (2).
Ou seja, esta história de cariz anticristão pró-judaico, afirma que a ressurreição de Jesus nunca existiu e que a toda a documentação existente sobre a sua vida, seja ela Bíblica ou mesmo de fontes não cristãs, é falsa. Ainda segundo a teoria, Jesus foi casado e teve 2 filhos…
Vamos aos fatos:
O que foi encontrado?
O túmulo contendo os ossos foi encontrado pela primeira vez em 1980 por uma equipe de construção no subúrbio de Jerusalém de nome Talpiot. Dez ossuários foram lá encontrados e levados para o Museu Arqueológico Rockefeller perto de Jerusalém, desses dez, seis foram inscritos com nomes que seriam traduzidos por Jacobovici e sua equipa como;
"Mariamenon e Mara" (dizem eles Maria Madalena?), “Yehuda bar Yeshua” (Judá, filho de Jesus); “Matia” (Mateus, que não existe registo de ser familiar de Jesus); “Yeshua (?) filho de Yehosef” (Jesus, filho de José) “Yose "(José?), "Marya" (Maria).
(As interrogações derivam do fato (como veremos adiante) das traduções dos nomes serem tudo menos consensuais entre os especialistas!)
À primeira vista até parece mesmo que encontraram a sagrada família, mas será mesmo assim? No desenvolver deste artigo veremos que as peças deste puzzle quando devidamente montadas apontam para tudo menos isso, e sim para uma monstruosa fraude que segue uma sinistra agenda.
Mas antes de tudo deve-se dizer que é verdade que esses ossuários foram descobertos num túmulo antigo. Porém milhares de túmulos similares e os mesmos nomes foram descobertos em Jerusalém, pois eram extremamente vulgares na época.
Os ossuários eram muitas vezes usados para conter os ossos de mais de um indivíduo. De fato, de acordo com Dr. Craig Evans, PhD, autor de Jesus and the Ossuaries, o túmulo de talpiot continha ossos de 35 indivíduos diferentes, e cerca de metade eram desses ossuários.
Pela altura da páscoa sempre vemos documentários em canais como o National Geographic a promover esta teoria e para não fugir à regra, nesta última época festiva a mídia corporativa voltou à carga em vários jornais e revistas tentando credibilizar o túmulo de Talpiot, onde supostamente teriam sido encontrados os ossuários de Jesus e da respectiva família.
No artigo (2) das referências já tínhamos analisado o quanto esta “descoberta” e seus propagandistas estavam envoltos em polémicas, contradições e mal contados, inclusive desmentidos e alegações de condicionamento, pelo que recomendo a leitura.
The Jesus Tomb Unmasked (O túmulo de Jesus desmascarado). Este documentário saiu posteriormente ao lançado por Jacobovici e Cameron e conta com a participação da maioria dos especialistas entrevistados no documentário anterior. Mas com um detalhe: Eles negam peremtoriamente as ilações traçadas no primeiro filme. E mais: afirmam ter sido manipulados pelos produtores, através de cortes de edição e distorção de informações, veja-o em: www.youtube.com/watch?v=-A9TlBLXZyk
RECENTES DESENVOLVIMENTOS
Mas uma vez que o assunto voltou a ser abordado com supostas "novas descobertas”, daremos aqui também a nossa opinião sobre elas.
Em primeiro lugar vejamos uma das mais recentes notícias avançadas:
Cientista diz ter descoberto evidência inequívoca sobre a tumba de Jesus
https://www.megacurioso.com.br/arqueologia/69877-cientista-diz-ter-descoberto-evidencia-inequivoca-sobre-a-tumba-de-jesus.htm
EVIDÊNCIA INEQUÍVOCA?!?
Vamos analisar…
Simcha Jacobovici (judeu ortodoxo e diretor do filme de Cameron), um dos maiores interessados em Talpiot financiou os testes de Aryeh Shimron
Como se pode ver pela notícia, agora o geólogo Aryeh Shimron, financiado pelo suspeito judeu ortodoxo Simcha Jacobvici, afirma ter encontrado uma evidência virtualmente inequívoca de que a sepultura de Talpiot realmente foi o último local de descanso de Jesus.
A Teoria
Resumidamente, Shimron afirma que um dos ossuários (que não estava nesse túmulo quando da descoberta original e que também já esteve envolto em polémica arqueológica como veremos adiante) seria de Tiago, um dos irmãos de Jesus, e ainda segundo ele e umas novas “análises” ao solo e entulho do ossuário, este no passado deve ter estado também nesse túmulo, dando (na sua opinião) mais uma prova que o túmulo de Talpiot realmente pertencia à família de Jesus.
Mas vejamos as incoerências deste suposto achado e as tais provas inequívocas de acordo com a própria fonte:
AS INCONSISTÊNCIAS DA TEORIA
1. O ossuário de Tiago foi encontrado antes do túmulo!
Vejamos o que diz a própria fonte:
“Outra inconsistência seria o fato de a tumba ter sido descoberta na década de 80, e o colecionador estar em posse do ossuário de Tiago desde meados dos anos 70.”
Ou seja, o ossuário que Shimron diz ser de Tiago, irmão de Jesus, não estava no túmulo quando da descoberta deste último e ainda por cima agora é admitido que um coleccionador já o tinha em sua posse desde os anos 70, anos antes da descoberta da tumba de Talpiot (?!?)
Sobre esta incoerência, a fantástica hipótese avançada por Shimron é que apenas esta caixa foi empurrada para fora do túmulo num suposto terramoto, as outras ficaram lá todas mais uma década (?!?), enfim…acredite quem quiser...
Contradição insanável
E neste ponto as novas alegações de Shimron e Jacobovici entram de imediato em contradição com as anteriores expostas no filme de Cameron, pois no filme é dito (bem na linha das teorias da conspiração) que o ossuário de Tiago estava no túmulo e desapareceu na escavação original, o que segundo Amos Kloner (3) (o arqueólogo que supervisionou o trabalho original no túmulo) era mentira!
Kloner afirmou que todos os ossuários foram catalogados no local e nenhum era o de Tiago.
Em uma nota (4), um dos arqueólogos que trabalhou no local em 1980, Joe Zias (5) escreveu:
Joe Zias jezias@yahoo.com para: Assunto: Re: Túmulo de Jesus Enviada: Quinta-feira, 1 de março de 2007 6:02 AM.
“Amos Kloner está certo quanto a eu ter recebido e catalogado os objetos, o décimo (referindo-se ao que Cameron e Jacobovici diziam ser o de Tiago) era simples (sem incrições) e eu o coloquei no pátio com o resto dos ossários simples, como era o procedimento padrão quando alguém tem pouco espaço disponível. Nada foi roubado ou desapareceu e e eles estavam completamente conscientes desse fato (REFERINDO-SE A CAMERON E SIMCHA JACOBVICI), só que isso simplesmente não se encaixa no interesse deles. Shalom, Joe”
Assim ficamos com uma contradição insanável que agora nem sequer é comentada por nenhum dos intervenientes, resumindo:
O ossuário que Cameron e Jacobovici disseram inicialmente ter desaparecido do museu Rockefeller após as escavações (anos 80) e que segundo eles era o de Tiago, irmão de Jesus, agora segundo o coleccionador que o possuía afinal estava na sua posse desde os anos 70!
Assim a solução que arranjaram para este dilema foi esquecer as primeiras alegações e dizer que devido a um terramoto o ossuário foi "empurrado" para fora do túmulo...
Mais palavras para quê???
2. A polémica em torno do ossuário de Tiago
E como se não bastasse, esse mesmo ossuário já tem sobre ele fortes suspeitas no que concerne à inscrição nele achada:
Nome de Jesus foi forjado em ossuário, dizem especialistas
https://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u9399.shtml
É que apesar de recentemente ter existido uma decisão judicial afirmando que a falsificação não podia ser provada (o que também não prova que a mesma seja verdadeira), foram muitos os especialistas a afirmar que a inscrição do ossuário de Tiago era uma falsificação, inclusive uma comissão técnica da Autoridade de antiguidades de Israel (6).
Para quem quiser saber mais sobre este julgamento e seus mal contados recomendo (7)
3. A falta de escrutinio por parte de outros cientistas
Jacobovici, não é um arqueólogo e sim diretor de filmes, sendo judeu ortodoxo não reconhece Jesus como o Messias de Israel
Segundo a fonte:
“Os resultados obtidos por Shimron ainda precisam ser publicados — e escrutinados por outros cientistas antes de serem considerados como prova de que a câmara pertenceu a Cristo."
Ou seja as evidências inequívocas ainda nem sequer foram publicadas e analisadas por outros cientistas…mas ainda assim toda a mídia se apressou a apresentar esta nova teoria…
4. Análise à patina dos ossuários no filme de Cameron
No documentário de Cameron foram feitas análises à patina (uma espécie de cobertura mineral que as urnas vão recebendo com o passar do tempo) dos ossuários de “Tiago” (que entretanto tinha sido encontrada na posse do dito coleccionador), “Mariamene” e outros ossuários escolhidos aleatoriamente no local de recolhimento das caixas, para saber se elas vêm do mesmo lugar.
O documentário alega que as composições químicas das pátinas de “Tiago” e “Mariamenon” batem certo como sendo do mesmo local, enquanto as outras, escolhidas aleatoriamente, não. Mas os gráficos são sobrepostos na tela em uma velocidade tão grande que o espectador só vai ter tempo de notar a maior das colunas, que mostra que um elevado teor de cálcio está presente em todos os ossuários (o que é óbvio já que as urnas são feitas de calcário). No entanto, uma observação mais atenta revela que, ao comparar os gráficos de “Tiago” e “Mariamene”, há diferença substancial em pelo menos duas das colunas maiores, que indicam maior presença de certos elementos químicos.
Inclusive, há mais semelhanças entre “Mariamenon” e uma das urnas escolhidas aleatoriamente do que entre “Mariamenon” e “Tiago”.
O documentário nem se preocupa em mostrar no que a pátina das outras caixas difere das atribuídas a Talpiot.
Ora analisando um artigo de Ben Witherington (7) sobre estas novas análises,
o que me parece a mim é que as tais evidências inequívocas de Shimron são uma reciclagem destes testes e nada mais. Mas como ainda NINGUÉM MAIS AS ESCRUTINOU, por enquanto nada mais podemos concluir.E para terminar este ponto recomendo ainda um artigo de Ben Witherington que tece vários comentários sobre este anúncio de Shimron, deixando aqui a conclusão:
"De fato, [Aryeh] Shimron não publicou seus resultados, nem houve revisão por pares deles por outros estudiosos, ainda assim outro filme de Jacobovici já está em preparo. Não é assim que estudos acadêmicos são feitos, quer em termos de financiamento, quer em termos de anúncios de resultados. Você não faz um anúncio bombástico à imprensa no fim de semana da Páscoa, antes que outros colegas tenham a chance de pesar as evidências, a não ser é claro que esteja tentando impressionar. E não há dúvida de que determinada agenda está sendo seguida aqui, como ficou claro com os filmes anteriores, e com toda a probabilidade com o próximo também. Não há interesse em ciência pura aqui."
Fonte: www.patheos.com/blogs/bibleandculture/2015/04/07/once-more-with-feeling-did-the-james-ossuary-come-out-of-the-talpiot-tomb/
Está confuso?
Não se admire, pois os inventores desta teoria querem jogar com a confusão e munindo-se de promoção mediática tentam provar o que não tem a mínima sustentação arqueológica, nem científica. Eles nem sequer se preocupam em explicar as enormes contradições dos dados que vão apresentando, simplesmente vão lançando notícias bombásticas apoiados por uma mídia tendenciosa seguindo uma agenda clara.
Mas os mal contados sobre este túmulo não ficam por aqui, na próxima parte veremos mais algumas pontas soltas desta novela da vida real.
Continua…
Referências:
(1) O Sepulcro Esquecido de Jesus - Parte 1
(2) Jesus foi casado e teve 2 filhos?!? – A farsa DaVinciana continua
https://www.nunes3373.com/news/jesus-foi-casado-e-teve-2-filhos-a-farsa-davinciana-continua/
(3) Amos Kloner
https://en.wikipedia.org/wiki/Amos_Kloner
(4) O Sepulcro da “Família de Jesus” foi identificado em 2007?
(6) Final Report Of The Examining Committees For the Yehoash Inscription and James Ossuary
www.antiquities.org.il/article_eng.aspx?sec_id=17&sub_subj_id=185
(7) Faith, forgery, science -- and the James Ossuary
https://articles.latimes.com/2012/mar/25/opinion/la-oe-burleigh-bible-ossuary-forgery-20120325
(8) Ben Witherington
pt.wikipedia.org/wiki/Ben_Witherington